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Diário do Ano C-19

Diário do Ano C-19

14
Set20

Regresso à escola

João Miguel Almeida

Hoje o meu filho, como muitas outras crianças deste país, regressou à escola após uma ausência de seis meses. No último dia em que tinha estado na escola, antes do confinamento ser decretado, eram seis alunos numa turma de 27. A maioria dos pais não tinha esperado pela caução do Estado para retirar os seus filhos da escola.

O regresso foi feito com expectativa, tensão e regras, muitas regras. Levámos o nosso filho à escola a pé, evitando transportes públicos. Os colegas do meu filho entraram um quarto de hora mais cedo do que era costume, às 8.45, e outros entraram às nove da manhã para evitar congestionamentos. Ainda assim, a entrada para a escola foi atrasada em alguns minutos por uma longa bicha frente a um portão verde, formada por pais de máscaras na cara e filhos quase silenciosos. As crianças despediram-se dos pais no portão, esfregaram a sola dos sapatos num tapete com fins de higienização, e foram à sua vida.

Pelo que ouvi dizer, o período de aulas decorreu normalmente, com as notas exóticas da professora falar atrás de uma placa transparente de acrílico quando estava sentada à secretária e com uma máscara, quando se encontrava de pé.

A escola promete uma «nova normalidade» e tanto adultos como crianças anseiam pelo cumprimento da promessa.

 

06
Set20

Há Festa no Seixal

João Miguel Almeida

É uma boa notícia, neste tempo triste, de distanciamentos, isolamentos e medos, haver festa à luz do dia e iluminada à noite. Vivemos num tempo bipolar, em que uma maioria se confinou mentalmente e algumas minorias contestatárias fazem festas clandestinas e até algumas festas loucas «da covid». Que alguns portugueses recusem quer o autoconfinamento quer a clandestinidade e façam uma festa cumprindo regras de segurança e enfrentando críticas merece o meu aplauso. A coragem é também isto, não é espicaçar touros.

Os portugueses que organizam a festa do Avante são comunistas, o que para uns é uma aberração e para outros não sei bem o que é. O universo do PCP é-me bastante estranho. Cresci a achar que os comunistas eram, na melhor das hipóteses, umas pessoas bem intencionadas, fiéis a uma ideologia condenada pela História. Com o passar do tempo fui percebendo que todas as ideologias se podem tornar obsoletas. Especialmente aquelas que, às tantas, se colocam no patamar do fim da História – como também foi o caso em regimes do chamado «socialismo real». Não ter ideologia não é nenhuma garantia para escapar à condenação da História. Alguém poderá sempre perguntar-nos: por que é que não fizeste nada para evitar que isto descambasse? Por que é que apoiaste um palhaço demagogo que nos levou à desgraça? Não ter ideologia não é desculpa.

Viver é correr riscos, como lembrou Jerónimo de Sousa – e bem. Já falha o alvo quando pensa que todos os críticos da Festa do Avante são anticomunistas, subestimando a insegurança popular que está a ser gerada pela pandemia.

Ainda não é desta que vou à Festa do Avante e talvez nunca vá. Mas, não sendo um fanático de festivais de verão nem comunista, este ano até tinha uma razão para ir à Festa do Avante: afirmar uma posição sobre a pandemia, recusando quer o medo quer a inconsciência.

03
Set20

Marcas da covid-19 na vida de todos os dias

João Miguel Almeida

A mobilização contra a covid-19 está a marcar a vida quotidiana. Algumas passarão à pequena história desta pandemia, outras continuarão connosco:

Envelopes nos restaurantes para guardar máscaras. Alguns restaurantes até capricharam nos logotipos inscritos nos envelopes. Para além do marketing, a eficácia da medida parece-me mais do que duvidosa. Mesmo desinfetando frequentemente as mãos parece-me mágico que uma máscara contaminada possa circular entre um ou mais envelopes e a cara de uma pessoa sem infetar ninguém.

Cartazes da clínica da mente na autoestrada a anunciar que tratam depressão, ansiedade e ataques de pânico. Provavelmente os cartazes já existiam antes da pandemia. Mas a covid-19 leva-nos a olhar para eles de outro modo. Em vez se dirigirem a uma minoria da população parecem dirigir-se à maioria.

Copos com saquinhos de ketchup, mostarda e maionese. O objetivo é que cada cliente toque apenas nos saquinhos que utiliza, em vez dos frascos de condimentos andarem a circular de mão em mão. É claro que o problema também se podia resolver desinfetando os frascos. Mas o impacto visual também conta.

Apps a classificar com cores a ocupação das praias. Além das apps há bandeiras. O vermelho é para praias com demasiada gente, o amarelo assim-assim e o verde para praias onde as pessoas estão à vontade para respeitar o distanciamento físico. Não vi ninguém a ser impedido de entrar na praia por causa de uma bandeira vermelha. Mas a ideia até pode pegar após o fim da covid-19. Qualquer pessoa poderá consultar uma app para saber em que praias é que corre menos riscos de tropeçar noutros banhistas.

01
Set20

Rentrée ou apocalipse?

João Miguel Almeida

Rentrée ou apocalipse?

O verão está a acabar e a rentrée encarada com ansiedade, pessimismo ou até paranoia por muitos portugueses. Não é fácil para leigos nestas matérias – que somos quase todos – encontrar um fio de racionalidade numa situação que alguns especialistas consideram absolutamente inédita e outros uma velha história contada pela enésima vez. Teorias científicas contraditórias chegam-nos misturadas com teorias da conspiração, dramas e tragédias humanas e desinformação a circular nos meios de comunicação social e nas redes sociais.

As intervenções dos cientistas como Gabriela Gomes e José Lourenço dão-me razões para pensar que a situação de saúde pública não se vai tornar catastrófica no próximo inverno. É possível que a imunidade de grupo já esteja próxima de ser atingida em algumas regiões do mundo, limitando o impacto de uma segunda vaga, e as características da sociedade portuguesa podem levá-la a alcançar a imunidade de grupo com uma percentagem mais baixa de pessoas imunes do que noutras sociedades mais homogéneas (ver aqui).

Se alguns matemáticos e epidemiologistas nos dão razões para ter esperança quanto à saúde pública, os economistas continuam a fazer diagnósticos reservados quando não completamente pessimistas. Há uma minoria de empresas que estão a lucrar ainda mais com a pandemia e a maior parte do tecido económico está a ser destruído ou sob pressão. Enquanto houver saúde para resistir à pressão e reconstruir a economia haverá razões para acreditar na resiliência e na criatividade dos portugueses.

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