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Diário do Ano C-19

Diário do Ano C-19

12
Fev22

O princípio do fim da pandemia

João Miguel Almeida

Quase dois anos após o início da pandemia, tive uma versão ligeira da covid-19. Como a minha mulher, o meu filho e milhares de outros portugueses que estão a ser varridos pela variante Ómicron. A sensação é de alívio. Foi um longo caminho percorrido desde o primeiro confinamento, marcado pelo medo do desconhecido e pelas certezas ilusórias de alguns negacionistas, até ao anticlímax de uma pessoa pensar que teve mais um ataque de rinite alérgica e afinal, o teste declarou, teve covid-19.

De certo modo, tive covid-19 na melhor altura possível: pouco tempo depois da terceira dose da vacina estar ativa. Mas há um grau de incerteza sobre os efeitos da covid-19 que apenas é ultrapassado depois de a apanhar. Nunca sabemos como é que o corpo vai reagir. Há pessoas em grande forma física que são arrasadas pela covid-19 e outras pouco dadas ao desporto que passam incólumes pela doença.

O clima geral é de descompressão. Já ouvi o seguinte comentário: «acabei de apanhar a terceira dose da vacina, agora devia ficar infetado para despachar isto». Compreende-se, embora não seja uma atitude recomendável. Nunca se sabe a covid-19 que nos calha na rifa e se atualmente a doença já mata pouco, as sequelas podem ser muito incómodas ou mesmo incapacitantes.

É claro que a distribuição desigual das vacinas por todo o mundo pode favorecer a emergência de novas variantes que façam descambar o processo de libertação da pandemia. Mas o nosso horizonte é muito melhor do que no tempo em que se dizia que talvez nunca se descobrisse uma vacina para a covid-19, como nunca se descobriu uma vacina para a SIDA. A situação pode piorar mas também pode voltar a melhorar. Falta-nos saber muito sobre o SARS-CoV-2 – nomeadamente sobre os seus efeitos a longo prazo – mas já sabemos o suficiente para travar a pandemia. É esse horizonte que nos permite respirar.

02
Fev22

A Cascata

João Miguel Almeida

Münch gripe espanhola.jpg

Ao longo da História as pandemias têm deixado marcas emocionais nas sociedades e nos seus artistas. Em 1918, Edvard Münch pintou o «autorretrato com gripe espanhola» (imagem acima). O jovem Hemingway, condutor de uma ambulância durante a I Grande Guerra, apaixonou-se por uma corajosa enfermeira que tratou das vítimas da pandemia. Foi uma relação que marcou a sua personalidade e a obra do escritor.

A pandemia da covid-19 já está a deixar uma memória na ficção contemporânea. Um exemplo é o premiado filme Cascata, uma produção de Taiwan acessível na Netflix (link).

Cascata.jpg

No filme, nenhuma das personagens principais – uma mãe e uma filha - é infetada com covid-19. A pandemia é como um «gatilho» espoletador de uma psicose numa mulher que já se encontrava sob pressão por motivos relativamente comuns: um divórcio mal resolvido; um trabalho demasiado stressante numa multinacional.

A identificação de um caso de covid-19 positivo na escola da filha, determina que a jovem e a mãe sejam colocadas em quarentena, entrando em choque emocional uma com a outra e consigo próprias. A quarentena funciona como a porta de uma barragem subitamente aberta, levando a água contida a precipitar-se numa enxurrada. Sem a defesa emocional das rotinas diárias, as emoções precipitam-se e é transposta a linha ténue entre sanidade mental e loucura.

O filme mostra os efeitos sociais e mentais da pandemia, os seus «danos colaterais» da saúde mental de pessoas com uma vida normal na sociedade contemporânea, com subtileza e precisão.

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