A Cascata
Ao longo da História as pandemias têm deixado marcas emocionais nas sociedades e nos seus artistas. Em 1918, Edvard Münch pintou o «autorretrato com gripe espanhola» (imagem acima). O jovem Hemingway, condutor de uma ambulância durante a I Grande Guerra, apaixonou-se por uma corajosa enfermeira que tratou das vítimas da pandemia. Foi uma relação que marcou a sua personalidade e a obra do escritor.
A pandemia da covid-19 já está a deixar uma memória na ficção contemporânea. Um exemplo é o premiado filme Cascata, uma produção de Taiwan acessível na Netflix (link).
No filme, nenhuma das personagens principais – uma mãe e uma filha - é infetada com covid-19. A pandemia é como um «gatilho» espoletador de uma psicose numa mulher que já se encontrava sob pressão por motivos relativamente comuns: um divórcio mal resolvido; um trabalho demasiado stressante numa multinacional.
A identificação de um caso de covid-19 positivo na escola da filha, determina que a jovem e a mãe sejam colocadas em quarentena, entrando em choque emocional uma com a outra e consigo próprias. A quarentena funciona como a porta de uma barragem subitamente aberta, levando a água contida a precipitar-se numa enxurrada. Sem a defesa emocional das rotinas diárias, as emoções precipitam-se e é transposta a linha ténue entre sanidade mental e loucura.
O filme mostra os efeitos sociais e mentais da pandemia, os seus «danos colaterais» da saúde mental de pessoas com uma vida normal na sociedade contemporânea, com subtileza e precisão.